segunda-feira, 9 de junho de 2014

Demônios na noite



O vento frio da noite sussurra e movimenta a porta que se abre lentamente, quase como me convidando a entrar, aceito o convite e num movimento discreto avanço e me posiciono longe da clarão da lua que adentra pelas janelas quebradas. O odor no recinto agride meu olfato, morte e mistério temperam o salão, móveis espalhados de forma desordenada como se uma luta tivesse ocorrido, não vejo padrão para identificar quantos haviam no local, na verdade não identifico nem de onde o cheiro de putrificação se origina apenas que ele está mais forte a cada segundo que passo no local.




Numa primeira observada, apenas para identificar ameças eminentes só vejo manchas pelas paredes que denunciam o motivo de eu estar ali, sangue espalhado pela parede, como se tivessem arrastado um corpo por todo o perímetro, peças de roupa estão estão soltas em pedaços, vejo alguns vestidos, jaquetas, restos de um uniforme de polícia , provavelmente algum policial que veio investigar os relatos de mortes no local.  A quantidade de sangue e as roupas de diferentes pessoal provam que muitos padeceram aqui, mas onde estão os corpos ? E esse cheiro querendo me sufocar ? Observo mais atentamente o local, um olhar mais investigativo,  vejo que todos  os móveis jogados estão caídos de forma como se algo no sentido horário tivesse rodopiado várias vezes na sala, a forma que o sangue está impresso na parede denuncia a mesma coisa, eu lentamente giro a cabeça acompanhando o sangue, começando da parede a minha esquerda, vejo um sofá de pernas para o ar, o sangue sobe mais para o alto da parede e desce novamente,  indo até o final, uma mesa de pernas para o ar, o sangue refaz o movimento ascendente na parede a minha frente e volta a se espalhar a pouco mais de 1 metro do chão, ele muda para a parede a minha direita, a estante jogada no chão, livros espalhados e mais uma vez o sangue faz um traçado se dirigindo  para o teto e novamente retornando ao nível anterior, ao mudar para a parede que me encontro ele sobe novamente, instintivamente, sinto um calafrio correr pelo meu corpo, o vento parece cessar seus trabalhos noturnos ali, a luz do luar parece enfraquecer, eu lentamente posiciono a mão no cinto e movimentando a cabeça para o teto acima de mim identifico o fim do rastro de sangue, bem como o que pode ter causado todos os crimes relatados, uma visão demoníaca,  uma forma grotesca, composta por partes de vários corpos, vejo várias pernas, braços, rostos costurados de forma irregular, os rostos espalhados em seu corpo, abrem os olhos me olham, com olhares de fome, eles gritam e o som gutural, eu me afasto rapidamente para o centro do salão, sob a capa eu me armo de alguns batrangues, a criatura se esgueira pela parede repetindo o caminho de sangue, ela repete várias vezes o caminho, ela tenta me desorientar, deve ser parte sua maneira de caçar, após alguns giros e nenhum sinal de que eu venha a ficar tonto, desorientado ou mesmo apavorado, ela para numa das paredes.

_ Ora, ora, o que temos aqui ? Um homem fantasiado de morcego que não teme a morte nem o mal personificado. Talvez tenha seus próprios demônios ou talvez seja um.  Pois bem, eu sou  Azoriath, 987º filho de Lúcifer, Devorador de Carne, Mal concebido pelo Mal, O assassino do inferno que caminha na Terra, banido para este mundo pelo meu pai pela minha fome insaciável por carne humana.

Sua voz parece ser a junção de várias pessoas falando em coro, não é a primeira vez que luto contra forças que não compreendo e pelo que me recordo isso nunca acaba bem e sempre demanda apoio, já que magia não é meu forte. Sinceramente,  odeio magia!

Lanço três batrangues rapidamente num movimento rápido, ele não se dá ao trabalho de desviar ou defender-se, apenas observa "sua" carne ser penetrada pelas lâminas, ele gargalha e salta para me atacar eu rolo no chão desviando de seus muitos braços, ele se agacha como uma aranha enquanto alguns membros de contorcem sozinhos.

_Você já durou mais do que qualquer um dos que entrou aqui dentro, mas isso me diverte!

Eu saco algumas cápsulas de ácido e aguardo um próximo ataque, que não demora, ele se descola para a parede a direita e em movimentos ágeis se coloca no teto e avança sobre mim, eu desvio de seus ataques e lanço os ácido  em seu rosto, ele urra de dor e começa a lançar sons com claro sentido de ameaças, provavelmente em seu idioma nativo.

Ele arranca um dos braços mutilados e o lança contra mim eu me esquivo e o braço apenas atinge a parede, ele lança outro braço e outro, arremessando um total de 10 braços, não lhe sobrando nenhum, apenas cerca de 4 pernas que lhe ajudam a se locomover.  nenhum dos arremessos surtiu efeito imediato, mas sinto a capa pesada, me puxando e sou surpreendido por várias mãos agarrando minha capa, me desfaço rápido dela mas não bastante para desviar de um terceiro ataque, ele me derruba e prende meu braços pisando sobre eles enquanto outros dos seus pés me pisoteiam, eu sinto o gosto de sangue na boca, o odor do corpo putrificado me golpeando, uma mistura de fezes e sangue escorre de suas pernas, a mente turva, algumas mãos alcançam meu pescoço e tentam estrangular-me, a criatura gargalha comemorando sua vitória eminente, o fim parece próximo, o ar fica difícil de respirar, eu visualizo meu agressor e num ar de espanto, entre tantas partes mutiladas presas a ele, eu olho e vejo rostos de crianças, não deviam ter mais que 7 anos, mortas por esta vil criatura, crianças puras, que provavelmente estão sendo procuradas pelos seus entes queridos, que não tiveram a oportunidade de brincar, crescer, serem amados, aquilo machuca, mais que os golpes deferidos contra meu corpo, aquilo queima meu interior mais que a podridão no ar, aquilo me impulsiona e numa explosão de ódio eu me debato e desequilibro-o, arranco de mim aqueles braços que tentavam me imobilizar.  

_Ainda há forças para lutar  ? Que seja, me divirta mais um pouco...

Estou ofegante, mas isso não impede que ataque, lanço duas mãos de batrangues que rasgam a carne podre, seguidos de cápsulas de ácido que derretem mais e mais seu corpo e  o enfurece, ele se lança num ataque tomado por ira, num giro de perna, desvio sua trajetória e ataco ao mesmo tempo, ele não detém  e avança, mesmo sem os braços ele continua a atacar, sua forma grotesca está piorando devido o ácido que corrói seu corpo. A cada investida sua eu contra ataco e me afasto e ele não parece cansar ao contrário de mim, que não consigo respirar direito, os golpes sofridos e o ar podre que preenche o local estão me abalando, eu saco alguns explosivos do cinto de utilidades e quando me preparo para lança-los ele gargalha!

_ Acha que destruindo essa forma física você irá me matar ?  Vamos,  tente, mas saiba que o que sou está além de uma forma física, jovens me clamam em seus rituais estúpidos e me aproveito para incorporar e isso sempre fica mais divertido a cada vez que faço, já destruíram outras vezes os corpos que habitei, já me prenderam em celas onde meus antigos hospedeiros ainda se encontram, já transcendi eras e ainda estou aqui! O que um mortal como você pode fazer contra mim ?

_ Você está certo, eu não tenho como para-lo definitivamente mas todas esses sumiços chamaram atenção de outra pessoa além de mim.

Na escuridão do corredor que dá para a porta por onde entrei, uma chama de isqueiro rasga o breu naquele ponto e uma face se revela enquanto é aceso um cigarro mal colocado num sorriso inglês. Cabelos loiros, barba por fazer e um sobretudo bege. Azoriath se mostra exitante e ao reconhecer o homem em pé por trás de mim ele grita numa mistura de ódio e loucura.


_ Coooonstatiiiiiiiineeeeeeee!

_ Sr. John Constatine para você ! Tudo pronto morcego, ele não tem como sair dessa sala mesmo que abandone o corpo.  Você parece que teve um certo trabalho aqui, ficando velho Batman ?

Sua arrogância inglesa sempre incomoda, mas pelo que ele me contou ele precisava de alguém que pudesse estar apto a lidar fisicamente e psicologicamente com o desconhecido sem que fosse uma ameaça real para que a criatura não abandonasse novamente o corpo atrás de outro hospedeiro.

_Ele é todo seu inglês.

Ele traga o cigarro profundamente, arregaça a manga do sobretudo, solta a fumaça em direção ao demônio.

_Você não irá escapar dessa vez, enquanto você se divertia com o meu amigo de capa que parece não ter problema com criaturas como você, você não pressentiu minha presença nos arredores e isso me permitiu marcar ao perímetro dessa casa com símbolos e magia que não irá lhe garantir fugir novamente de mim.

A criatura está ensandecida, ela olha para todas as direções, enxerga algo que não posso ver, mas com certeza a incomoda, sua imagem está pior, ausência dos muitos braços espalhados no local, a corrosão na sua carne feita pelo ácido e todo o sangue  e sujeira que cobre suas várias pernas, realmente uma visão aterrorizante para um homem comum, não para mim.

_Constatine, eu irei devorar suas tripas enquanto me banho no seu sangue, irei estuprar seus amores enquanto assiste de sua cabeça decapitada!  E você homem morcego, irei influenciar quantos puder para tornar sua vida de justiça e dedicação uma vida de sofrimento e frustração.

John tira um canivete de um bolso, faz um corte na palma de uma das mãos e com a outra retira de outro bolso um pequeno livro de capa de couro envelhecida, ele abre numa página marcada e apoia a mão sangrando em cima dessas duas páginas. Azoriath agoniza tentando deixar o corpo, se joga contra as paredes, gritando de ódio, palavras desconhecidas por mim. A sala começa a escurecer mais, tomada por uma sombra que vem de fora da casa cercando o demônio. John profere algumas palavras, talvez em algum idioma antigo, a sombra envolve o corpo da criatura e o chão se abre abaixo dela, fogo e mãos agarram Azoriath e o puxam para o inferno enquanto ele grita suas últimas ameaças contra Constantine.

O chão se fecha e a sala parece menos escura agora, Constantine guarda seu livro enquanto o sangue escorre pela mão.

_ Mais um pra minha conta. Bem,  não é do meu costume mas obrigado Batman, esse trabalho fica mais fácil quando alguém pode levar os socos no meu lugar.

_ Constantine, você abusa dos limites da minha paciência, mas mesmo assim, obrigado por dar cabo desse mal que estava em Gotham, apenas garanta que ele não volte!

_ Medo que ele volte ? Ora, ora ...

_ Não, apenas não quero mais inocentes morrendo! E também não quero ter que estragar seu sorriso petulante.

_ Entendo, mas me diga uma coisa, ele não sentiu minha presença porque está focado demais em você, já que não demonstrou pavor frente ao horror e loucura que ele havia se transformado, por que ?

_ Por que o que ?

_ Por que não sentiu medo de algo que nem sequer parecia humano ?

_ Conheço "demônios" piores, mais complexos, um em especial me assusta, um que gosto de jogar suas vítimas em meu caminho, corromper almas por diversão, não quer dinheiro para gastar ou poder para governar, ele deseja apenas espalhar sua loucura em meio as suas risadas e eu estou ficando sem opções de como lidar com ele.

_ Bem, boa sorte com ele, eu já tenho muito trabalho com os meus.  Dever cumprido, hora do prazer!

Ele ascende tira um maço de cigarro, saca seu esqueiro novamente e enquanto ascende me pede alguma coisa que não fiz questão de ouvir.

_ Batman, mais uma coisa, que tal uma carona ? Batman ? Droga, achar um táxi nessa merda de cidade não vai ser fácil.







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