terça-feira, 13 de maio de 2014

Presas, Predadores e Outras Criaturas da Noite: Protetor


A chuva já castiga a cidade a dias e levando em consideração o que os serviços de meteorologia vem divulgando, ainda tem muita água para cair, o que por um lado, diminuiu a onda de calor que vinha assolando a região e diminuiu a taxa de ocorrências criminais, ao menos isso é o que os relatórios da polícia apontam, mas para quem precisa sair a noite para trabalhar, sabe muito bem que a chuva talvez oculte estatística e espante policiais, mas não é incomodo para quem está disposto a matar para conseguir o que se quer.


Longe da chuva, dentro de  bares, boates e outros estabelecimentos de frequentadores de caráter duvidoso, a noite segue seu ritmo com suas criaturas a procura de algo, seja prazer, dinheiro, drogas ou algo pior. 
Próximo ao rio que corta a cidade, já próxima a zona suburbana, um letreiro em neon rosa destaca-se, convidando quem passa pelas redondezas a saírem da chuva, buscarem uma cadeira para sentar e pedir uma bebida enquanto os aromas distintos de perfumes baratos e cigarro se misturam criando uma névoa no ambiente iluminado por pequenos lustres em cores variadas.

A música no local não diz nada, não tem palavras ou frases apenas um conjunto de sons acelerados, apenas serve para que os corpos dancem, balancem simulem tremedeiras ou seja lá como eles denominem o que seus corpos estão fazendo.  Alguns locais dentro do recinto são mais escuros e discretos, algumas silhuetas se entrelaçam ali, não há como distinguir quem é quem, mas as formas e movimentos dizem exatamente o que está acontecendo levantando apenas algumas dúvidas de quantos estão envolvidos e quais os sexos dos mesmo.



No balcão uma jovem garçonete, Sonia, conhecida pelos belos sorrisos e cabelo cor de fogo, tenta a todo custo atender o máximo de pedidos sem perder o charme que é peça importante em seu trabalho, não que ela precisasse se apoiar nele, seu corpo e trajes já são suficientemente sensuais.  Entre um drinque e outro que ela mistura, o suave balançar dos seios hipnotiza alguns pobre coitados, eles não estão  a mostra por completo, eles não estão a mostra, apenas cobertos por uma blusa de botão semi aberta de tecido branco.  Os cabelos vermelhos soltos se destacam sobre sua pele branca, ela lembra quase um ser  mágico, um elfo. Um homem no balcão  lhe pede um drinque específico, ele tem sorri de forma bem indiscreta como se existisse algo por trás do pedido e existe , ela baixa a cabeça, sorri e alguns segundos depois, faz um giro lento, quase artístico, movimenta-se em direção da parede por trás do balcão, se apoia numa escada e começa a subir lentamente,a cada degrau a pequena saia parece diminuir  e dar espaço as pernas levemente torneadas,  hipnotizando meia dúzia de clientes no balcão.  O espetáculo da garçonete acontece sempre que pedem algum drinque que precisa de algumas bebidas mais nobres que se encontram estrategicamente nos locais mais altos do bar.

A noite está acabando, o movimento diminuindo e apenas um pequeno grupo de  clientes se mantém ali, insaciáveis, eles se aproximam do bar e começam a pedir mais bebida, falam alto, batem no balcão, insistem em passar mais tempo no local e querem que ela fique fazendo seu pequeno espetáculo no bar.  As regras da casa são claras, enquanto o cliente tem dinheiro para gastar a casa está aberta para ele.  Os seguranças não ligam, estão acostumados a isso, universitários, militares, pais de família, viciados, políticos e qualquer tipo de pessoa que queira relaxar, diante disso, eles ignoram qualquer coisa que não seja considerada uma agressão física aos funcionários ou um prejuízo ao estabelecimento.

Visivelmente cansada, já , mas eles continuam a pedir que suba os 6 degraus da escada para buscar pequenas doses de uma outra bebida, sistematicamente para que ela se desgaste, deixando claro que não estavam mais interessado em sua beleza mas somente em humilhar.

Após mais alguns pedidos, desaforos, comentários detestáveis, alisados indevidos e mais olhares obscenos , os rapazes se cansam e resolvem ir embora e Sônia pode encerrar seus serviços no bar e ir para casa, pra seu descanso. Ela se despede dos rapazes que irão ficar para fechar as portas, dá uma olhada ao redor para se certificar que não há nenhum elemento suspeito, como sempre apenas um pobre coitado morador de rua que "mora" num antigo estabelecimento abandonado e castigado pelo tempo. Perto dali, os rapazes que a importunavam discutiam entre si sobre o próximo destino da noite deles, nem pareciam notar sua presença ali na saída do bar.

A chuva ainda caía forte e a noite era preenchida pelo vento frio de inverno, com exceção das luzes de alguns bares, boates e semáforos e um ou outro poste de luz, praticamente não havia luz naquela região. As calçadas sempre repletas de indigentes, moradores de rua, que vivam as consequências de suas escolhas em outros tempos, a maioria pessoas procurando apenas confortar a alma enquanto os seus dias na terra terminam.  Um ou outro pedia uma ajuda, conhecia a maioria deles de vista, quando sobrava alguma coisa na cozinha do bar gostava de levar duas quentinhas, uma pra ela e outra para deixar com os pobre coitados, não sabia dizer se fazia isso  por solidariedade ou em busca fazer deles amigos e poder voltar pra casa tranquila  já que alguns ali a assustava.

Umas cinco quadras a frente estaria chegando no seu apartamento, se deixava levar por alguns pensamentos tolos, saudade de amores da adolescência, sonhos de um bom casamento e como sua realidade não lhe agradava, seus pensamentos foram interrompidos por uma luz alta de um veículo vindo em sua direção, cobriu os olhos e o carro parou ao seu lado, sua intuição feminina já imaginava que não seria coisa, naquele horário numa é, as portas se abrem e ela reconhece os ocupantes do veículo, eram os rapazes que há pouco estavam no bar.  dois desceram e vieram em direção fazendo elogios vazios a sua beleza, outros dois desceram logo em seguida e quando ela deu por si, estava rodeada pelos quatro, entre alisados de cabelo e mãos mais atrevidas ela sem perceber foi conduzida para um dos muitos becos escuros que existiam por ali.

 _ Calma mocinha, não tem pra que ter medo de nós _ disse um deles, sorrindo de forma maliciosa.  Sentiu as mãos de outro alisando seu corpo, alguns faziam comentários, puxavam conversa enquanto ela era claramente conduzida para para o fim do beco.  Ela começa a suar, diz que está com pressa, sua mãe está esperando por ela, inventa várias desculpas e mentiras para que eles deixem ela ir embora.  Ela sabe o que vai acontecer ali, ela já ouviu relatos de outras amigas de trabalho e das garotas de programa que frequentam o bar sobre casos de estupros, mas sempre acreditou que não aconteceria com ela, mas agora era sua vez.

_ E aí, vai ser do jeito fácil ou do jeito difícil ? _Pergunta um dos rapazes já tocando em seu membro.

_ Por favor, eu não fiz nada, não façam isso comigo, você são legais, posso conseguir algumas garotas para vocês amanhã no bar...

Eles apenas riem e conversam entre si sobre o que querem fazer primeiro com ela, sente seus braços serem imobilizados enquanto seus seios são apertados, alguns botões da blusa são abertos,  sente seu corpo ser atacado por várias mãos como se quisessem abri-la ao meio,  ela grita e é interrompida com um soco  no rosto, o gosto de sangue se espalha na boca e seu mundo parece girar, ela vê todos aqueles homens de calças abaixadas, ela chora, ela clama por ajuda e antes que o pior acontecesse, suas preces são ouvidas.

   Saindo de trás os entulhos que se amontoavam na entrada do beco, uma sombra se move lentamente, uma sequência de  clarões no céus iluminam  a cidade revelando uma homem humilde, barba espessa se destacando no rosto escondido pelo capuz de uma jaqueta velha num tom cinza escuro, um tanto grande, calça camuflada e botas.  Os rapazes não se intimidam com a presença dele.

_ Se manda vagabundo! A moça aqui não é para bico de mendigo de rua.  Vá atrás daquelas viciadas em crack! _ Esbraveja um dos rapazes.

_  Se vocês amam seus "amiguinhos" e pretendem sair com eles intactos, eu aconselho que se vistam, peçam desculpas a jovem e não apareçam mais na vida dela e nem pelas redondezas.

O grupo se irrita, se vestem novamente  para então se dirigirem em direção do estranho enquanto vão fazendo ameças verbais, Sonia tenta se recompor mas está assustada demais e apenas observa o grupo cercando o homem, que ela parece reconhecer, lembra o mendigo que mora em frente ao bar, ela apenas não entende o que ele está fazendo ali. Um dos rapazes saca um punhal, os olhos de Sonia se arregalam com a cena que ela está presenciando, dois se armam com barras de ferro que estavam por ali, apenas um estava de mãos vazia, mas pelo tamanho dele não parecia se sentir desarmado, muito pelo contrário, parecia ser o mais ameaçador.

O estranho apenas adota uma postura mais defensiva, levanta os punhos e observa enquanto o primeiro com a barra de ferro vem em sua direção com a barra levantada sob a cabeça, ele difere um golpe reto vertical de cima para baixo, visando quebrar o crânio do seu oponente que move-se para o lado apenas observando a barra bater numa poça d'água com força respingando água,  com um um único golpe, um cruzado no queixo desprotegido do rapaz deixa o coitado desacordado no chão.  O beco clareia novamente e apesar da barba, Sonia e os rapazes que ainda estão de pé, notam que o estranho está sereno, não parece estar nem um pouco preocupado.

_ Algum ainda quer tentar  sorte? Melhor vocês levarem o amigo de vocês enquanto ainda conseguem .

Outro armado com outra barra vai em sua direção aplicando vários golpes horizontais, desordenados mas visivelmente perigosos, a barra passa cada vez mais perto enquanto o estranho apenas se move para trás e para baixo, esquivando dos golpes, num movimento rápido ele se abaixa e a barra passa zunindo acima de sua cabeça, os braços do rapaz deixam seu queixo desprotegido e novamente, com um único soco vindo de baixo para cima o rapaz é tirado do chão e jogado para traz caindo como uma pedra no chão.

_ Rapazes, isso não vai acabar bem, vão para casa... _ Antes  de terminar a frase o maior deles que estava desarmado, avança rapidamente, pelo porte e agilidade ele parece ter experiência com lutas, agarra-o pela cintura e rapidamente gira ficando por trás para imobilizar o suposto mendigo numa mistura de abraço e mata leão, enquanto isso o que possuía um punhal se lança num golpe empunhando sua lâmina em direção ao abdômen que com um chute lateral no braço é desviada e com a outra perna aplica dois chutes entre as pernas que o fazem lentamente cair no chão agonizando em dor.

_ Eu vou fazer você desmaiar sem ar e depois irei arrancar suas tripas seu vagabundo imundo! _ Grita o ultimo que está sufocando-o. O homem sabe que sua situação não é das melhores, já está sentindo a falta de ar e com certeza seu adversário é mais forte que ele e bem mais pesado, terá que jogar sujo, ele então agarra os dois dedos menores da cada mão do seu oponente e os torce de uma única vez,um grito de dor ecoa pelo beco e em seguida o estranho homem se solta do abraço mortal e soca duas vezes o estômago, o que faz seu oponente se curvar facilitando o golpe seguinte, uma joelhada que leva-o ao solo desacordado.

A poucos metros dali, Sonia apenas observa assustada, encolhida, maquiagem borrada com a chuva e lágrimas, tremendo, temerosa pelo que poderia ter acontecido, com a forma brutal que tudo se resolveu e por não saber se está a salvo ou se o pior viria agora. Lentamente ele se encaminha até ela e a cada passo ela se encolhe mais, se aperta mais contra a parede, sua voz tenta sair, gritar, mas como antes com os rapazes, sentia-se fraca e frágil.  O estranho continuava a vir em sua direção, chega perto o bastante para ela ver seu rosto, sua barba mal cuidada, cabelos emaranhados por baixo do capuz, ele toma a mão dela cuidadosamente, algumas latas ao fundo rolam o som quebra o som harmônico da chuva caindo ela se assusta com o som, o homem range os dentes, aperta a mão dela e se vira para onde deviam haver 4 homens deitados, mas o que tentou esfaqueá-lo estava de pé, com uma pistola  na mão.



_ Agora quero ver o que você vai fazer... _ O rapaz da faca saca uma pistola, o mendigo coloca a mão para traz, o rapaz destrava a arma, o homem se move lateralmente para longe de Sonia, a arma é carregada, apontaria feita quando o referido alvo lança uma lâmina que acerta a mão que empunhava a arma em cheio fazendo o rapaz afrouxar a arma quase deixando ela cair e num reflexo de dor, ele aperta o pulso da mão ferida, quando é surpreendido por uma mão tomando a arma e outra de punho cerrado socando seu rosto nocauteando-o.

De posse da arma o dito mendigo, observa o modelo e com grande habilidade desmonta a arma e joga partes dela dentro de um esgoto que passava  ali, ficando apenas com o carregador municiado.

_ Isso fica comigo, a pólvora serve pra ascender uma fogueira em noites frias.

_ Tu-tu-tu-do bem fique com o que quiser, a-a-apenas me deixe ir ...por favor. _ gaguejava de tanto medo.

_Por favor, desculpe se lhe assusto,  não estou interessado em nada que esteja pensando, apenas não queria que você se machucasse.Melhor você ir, essa chuva pode acabar lhe deixando doente. _ Visivelmente abatido pela má impressão que causou a ela.

Sonia, percebe que há uma certa preocupação dele para com ela, mesmo nervosa, pede desculpas e sai andando as pressas , quando chega na saída do beco, ela olha para trás vê a figura envolvida pelas escuridão do local e gagueja algo _ O-o-bri-bri- gado _ E corre para casa.

Ele a vê  sumindo na noite enquanto a chuva bate em seu rosto, escorrendo pela barba e entre o som das gotas caindo no chão, o vento soprando e alguns gemidos no fundo do beco ouve-se saindo de sua boca um suave sussurro _ Vá em paz minha filha.

O estranho mergulha na noite  e de longe faz o que toda noite procura fazer de forma silenciosa e discreta, proteger quem ama.

  


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